O ano de 2010 está a chegar ao fim, mas o ciclo de Comemorações do Centenário da Implantação da República só terminará oficialmente em Agosto, quando se concluirem os cem anos da publicação da Constituição de 1911. Apesar de ser um tema já bastante tratado, entendemos que ainda não se falou o suficiente. Como se pode invocar a cidadania, a cultura cívica, se não se tiver uma ideia clara das repercussões da Revolução de 1910? Não para fazer acriticamente a sua apologia ou para esconjurar a priori este facto histórico. Analisar os seus defeitos e as suas virtualidades e formar uma opinião fundamentada, será a posição mais correcta e construtiva.
Conhecer a Primeira República, conhecer os seus protagonistas. Em Mortágua, conhecer melhor Tomás da Fonseca, entre outros. Conhecer melhor António José de Almeida, em Penacova. Há seis anos, foi publicada pelo Círculo de Leitores uma “biografia ilustrada” intitulada António José de Almeida e a República: discurso de uma vida ou vida de um discurso. A iniciativa partiu do presidente da Câmara, Engº Maurício Marques, tendo como assessor o Dr. Leitão Couto. Trata-se da primeira obra do género sobre umas das figuras “ mais combativas e, ao mesmo tempo, mais consensuais” da I República, para além de ter sido o único presidente a cumprir integralmente o seu mandato”. António José de Almeida foi “um dos mais importantes políticos da Primeira República, não só na sua fase institucional de 1910 a 1926, mas também na sua fase revolucionária, sobretudo após 1890.” Não somos nós que o dizemos. São palavras do Prof. Luís Reis Torgal, o autor deste livro.
Ainda muito carenciado em termos de estudos histórico – sociais, esta obra veio enriquecer, sem dúvida, o município de Penacova. Goste-se ou não de António José de Almeida, é incontornável a sua importância no contexto local e nacional. Nunca o concelho de Penacova teve outra figura com semelhante projecção. Desde cedo se revelou um lutador por ideais e valores republicanos. Em 1890 é preso em Coimbra, por questões políticas, o que levou o seu pai, José António de Almeida, presidente da Câmara de Penacova, a renunciar ao Partido Progressista e a filiar-se no Partido Republicano, chegando mesmo a apresentar a sua demissão, que entretanto não foi aceite pelos vereadores Artur Leitão, Costa Santos, Rodrigues e Martins de Figueiredo.
Depois de exercer medicina em S. Tomé, regressa ao continente onde retoma a carreira política. É eleito deputado e está presente no comício republicano de 1 de Agosto de 1909, em S. Pedro de Alva. A sua influência foi grande em Penacova. Recorde-se também a Inauguração dos Centros Republicanos de S. Pedro de Alva (1 de Agosto de 1909) e de Penacova (1 de Dezembro de 1910), bem como a acintosa doutrinação republicana através da imprensa local. A um nível ainda mais próximo das suas origens, refiram-se as suas passagens frequentes pela casa de familiares. Por exemplo, da irmã Virgínia e cunhado, José de Oliveira Coimbra, no Silveirinho, e também da outra irmã, Albertina, casada com Eduardo Pedro da Silva, farmacêutico em S. Pedro de Alva, o que atesta também a sua familiaridade com as gentes que o viram nascer. Dele dizia o Dr. Daniel Silva em 1910: “ Aqui nasceu, aqui balbuciou as primeiras palavras, aqui tem as cinzas dos seus saudosos pais, aqui tem os seus amigos e companheiros de infância”.
Foi Deputado ainda na vigência da Monarquia (1908), foi Ministro do Interior no Governo Provisório (1910), foi “ Primeiro-Ministro” do Governo da União Sagrada (1916), com Afonso Costa, e foi Presidente da República de 1919 a 1923. Além de figura nacional, António José de Almeida foi, sem dúvida, também uma figura tutelar do republicanismo no nosso concelho. Penacova reconheceu-o, instituindo o feriado municipal a 17 de Julho, 110 anos após o seu nascimento em 1866.
No ano do Centenário da República, a obra António José de Almeida e a República: discurso de uma vida ou vida de um discurso assume uma importância ainda maior. Este livro é, pois, um óptimo meio de conhecer melhor a vida e a obra deste nosso ilustre conterrâneo. Valorize-se ou não a nossa Memória Colectiva, continuamos a defender que para compreender o Presente é preciso saber alguma coisa do Passado. É assim para a nossa história e identidade pessoal, é assim também para a nossa história e identidade concelhia.
David Almeida
23-12-2010
In Jornal Frontal
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