18/02/11

O fôlego que electrizou Portugal: uma homenagem ao Poder Local

De ressonâncias ( e de algumas ânsias ) é tecida esta crónica que temos vindo a publicar ao longo dos meses e de alguns anos. Ecos que ressoam, mesmo com o passar dos anos, reflexos de factos e de escritos. Reflexões que necessariamente nos convocam para, em diálogo com o passado, com o presente e com o amanhã, registar nas páginas do Nova Esperança, pequenos apontamentos que procuram um diálogo implícito com os leitores.

Ora, em vésperas de eleições autárquicas, trazemos aqui algumas ideias que, nos tempos idos de 1993, tivemos a oportunidade de ler na Revista de Guimarães, tendo como autor Kruz Abecassis, que como muitos se recordam foi presidente da Câmara de Lisboa.
Escrevia então este ex-autarca que “ o exercício das funções de Presidente de uma Câmara, é a mais apaixonante e envolvente tarefa que pode ser atribuída a um político”. Em 2009, apesar de, para muitos ser questionável esta afirmação, somos dos que ainda acreditam que é possível ser autarca com sentido de serviço à comunidade, dum modo desinteressado e transparente. Explicitava, então, Abecassis que “num país como Portugal, com uma tão forte tradição municipalista, o desempenho de tal cargo constitui, no mais profundo sentido da palavra, uma tarefa a tempo inteiro, tal é o envolvimento que exige com as populações e tal é a diversidade dos assuntos para que, constantemente, é chamada a sua atenção.”

Cremos que ninguém contesta a ideia de que, com o poder local democrático, instaurado em 1976, “terras adormecidas durante decénios, um pouco por todo o espaço que somos, acordaram e mobilizaram-se para enfrentar os desafios do futuro e proporcionar aos seus filhos a vida de progresso e de cultura, que é indispensável nos nossos dias.”

Recordamos a nossa experiência pessoal, quando nos tempos a seguir ao 25 de Abril, quase a nível de voluntariado, ajudámos a alcatroar a estrada principal da freguesia, juntamente com muitos jovens ( o Engº Valdemar Rosas, por exemplo) tendo como presidente da junta o Sr. José Henriques. Tantas e tantas “ aventuras “ vividas, que naqueles tempos de generosidade e utopia, reverteram para melhorar as infra-estruturas básicas de que as nossas terras tanto necessitavam. Mais tarde, também como Presidente de Junta, procurámos fazer sempre o melhor que sabíamos e podíamos por uma freguesia ainda muito carenciada.

Mas voltemos à prosa, bem mais apurada do que a nossa. Escrevia Abecassis que “nas aldeias do alto das serras, ou nas do fundo dos vales, surgia a tão ambicionada electricidade e com ela o contacto com o Mundo. Captaram-se águas e estas foram distribuídas domiciliariamente, onde nem fontanários existiam. Multiplicaram-se redes de saneamento e rasgaram-se estradas e caminhos. Os lugares aproximaram-se e os portugueses deram-se as mãos para preparar esta grande festa do desenvolvimento e da conquista da dignidade dos homens.”
Sendo os autarcas, aqueles que estão mais próximos “ do seu povo e com ele partilham as mesmas carências, os mesmos anseios e vivem as mesmas ambições e frustrações”, deles se poderia dizer que, na tradição histórica portuguesa eles continuam a ser “ aqueles a quem se chamou, desde os primórdios da nacionalidade, os “homens bons” dos concelhos.
As autarquias locais vieram, em certa medida, reanimar um órgão fundamental da administração pública portuguesa, cuja importância vinha dos recuados tempos de D. Afonso III quando, pela primeira vez, os procuradores dos concelhos tinham conquistado o seu lugar nas Cortes de Leiria.
Na linha de pensamento do Engº Kruz Abecassis, diríamos que, a instituição do poder autárquico veio restituir às populações a noção de que depende da sua mobilização e da sua vontade colectiva o desenvolvimento local e que todos somos actores, a corpo inteiro, da caminhada no sentido do bem estar social .
“ Todos nós conhecemos e presenciámos este novo fôlego que electrizou Portugal e lhe transformou a face: o aparecimento de novas estruturas difusoras da cultura ou de ocupação dos tempos livres; os equipamentos desportivos, à disposição dos jovens e dos adultos; a iluminação pública renovada e reforçada; o tratamento e distribuição domiciliária das águas; o estabelecimento de redes de saneamento e estação de depuração e tratamento de esgotos; a renovação e extensão, a novos ramos, do seu comércio; a instalação de serviços e a captação de novas indústrias, deixaram de ser privilégio exclusivo de alguns centros do país.” – escreveu acertadamente Kruz Abecassis.
E, a terminar não deixamos de voltar a citar este autarca . As suas palavras, são, acreditamos nós também, uma homenagem e um estímulo para quem , por este país fora tem honrado e continuará a dignificar a função política:
“Cada vez que se vence um obstáculo – valeu a pena! / Cada vez que se abre uma escola – valeu a pena! / Cada vez que se constrói uma casa – valeu a pena! /Cada vez que se abre uma estrada – valeu a pena! /Cada vez que se ilumina um caminho – valeu a pena! /Cada vez que se planta uma árvore – valeu a pena! /Cada vez que se desperta a esperança de quem já não a tinha – valeu a pena!
Porque a vida dos homens é feita destas pequenas coisas que condicionam a sua realização e a sua felicidade. / Porque a missão que escolhemos foi a de melhorar a vida dos homens./ Valeu a pena!”

David Almeida *
in jornal NOVA ESPERANÇA, Set 2009
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*Licenciado em Filosofia

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