Em Fevereiro de 2008 escrevíamos neste jornal uma crónica sobre Vitorino Nemésio, Oliveira Cabral e Varela Pécurto. Três “embaixadores” das belezas naturais de Penacova. Fizeram-no por meio da escrita, no caso de Nemésio e Oliveira Cabral e através da fotografia, no caso de Pécurto. Passado algum tempo, recebemos uma carta duma assinante do NE, que tendo deixado a sua terra há muitos anos, manifestava a emoção que sentira ao ler o nosso artigo, recordando o convívio que tivera com esse grande amigo de Penacova, Manuel Oliveira Cabral. Em resposta, prometemos uma visita, que só agora se concretizou.
“ Convivi de muito perto com o Senhor Oliveira Cabral e sua esposa D. Estefânia Cabreira quando eles iam aí passar as suas férias” – confidenciava-nos, então, na sua carta, a Srª D. Maria Eduarda Silva, professora aposentada, a viver em Sátão. E acrescentava: “ Ensinaram-me esses versos, “Penacova-a-Linda”, para eu cantar numa festa, com música da D. Estefânia ao piano. E muitas vezes se repetiu a cena nos serões de entretenimento que se realizavam no Salão dos Paços do Concelho.”
É assim que, depois de, com toda a amabilidade, a Srª D. Eduarda nos ter recebido na sua casa, surge esta reportagem-entrevista . Uma agradável conversa, da qual resultaram estes apontamentos sobre algumas memórias duma época, que estamos convencidos, muitos penacovenses irão apreciar. Filha de Eduardo Silva e neta do Dr. Rodolfo Pedro da Silva, figura importante na Implantação da República em Penacova, de quem falaremos num próximo número. Com muita saudade recorda a casa do avô, onde passou muitos e bons momentos. A tristeza invadiu-lhe a alma quando soube que o edifício, que a família vendera há uns anos, depois de ter saído de lá o quartel da Guarda Nacional Republicana, se encontrava actualmente em ruinas.
Falou-nos da sua vida de professora primária. Começou a trabalhar no Seixo (Carvalho) tendo de seguida leccionado no concelho de Oliveira do Hospital. A sua carreira foi entretanto desenvolvida no concelho de Sátão, onde se aposentou, deixando muito boas recordações nos seus alunos que ainda hoje a visitam. Dos tempos que viveu em Penacova guarda muita saudade. O seu pai era funcionário das Finanças. Apoiante de Humberto Delgado algumas vezes foi perseguido pela PIDE. Também esteve ligado ao Jornal de Penacova, tendo sido redactor do mesmo, no início da década de trinta. Talvez por isso, sempre incentivou a filha a colaborar na imprensa local.
Ela, assim o fez, principalmente através da poesia. Não no Jornal de Penacova, já extinto na altura, mas no Notícias de Penacova. Tivémos o privilégio de ler alguns dos seus poemas, plenos de sensibilidade, sobre a sua terra natal, publicados em 1950. Ainda hoje escreve num dos jornais locais.
Falou-nos também de Oliveira Cabral, enquanto pessoa que gostava muito de Penacova, não se limitando a passar férias desligado das vivências locais. Bem pelo contrário, era uma pessoa que não sendo penacovense, se envolvia nas dinâmicas culturais e recreativas, chegando mesmo a oferecer uma aparelhagem para dar mais vida aos agradáveis serões que tinham lugar na “Casa do Povo”. Segundo nos contou a nossa entrevistada, no piso do rés-do-chão do actual Edifício dos Paços do Concelho, onde será agora o Salão Nobre, existia um salão, com espaço para mesas de bilhar e pingue-pongue, que fazia ligação com o Café Turismo. Aí se realizavam bailes, concursos de “Miss Penacova”, saraus musicais e teatro, constituindo assim um dos centros de convívio dos penacovenses. No primeiro piso, funcionavam então os serviços da Câmara. Por aquele tempo – conta a Srª Profª Eduarda - vivia num palacete (actual edifício da Casa do Repouso) uma senhora brasileira, chamada Raimunda de Carvalho, que ensaiva Teatro e Declamação, contribuindo tudo isto para uma certa animação cultural da vila. Falou-nos ainda das festas dos Bombeiros, do Coreto que existia na Avenida 5 de Outubro, ali em frente da actual Câmara, das Festas da Nossa Senhora da Guia e do Montalto…
Agradecemos à Srª Professora Eduarda Silva toda a gentileza com que nos recebeu e partilhou connosco momentos da sua vida em Penacova, da sua amizade com Oliveira Cabral e esposa, bem como das gratas recordações do seu avô, Rodolfo Silva. Quer de um, quer de outro, falaremos nos próximos números, no sentido de recordar dois Homens que marcaram, não só a história pessoal de muita gente, mas também a vida social e cultural de Penacova.
Sátão, 29 de Dezembro de 2010
David Almeida
in Nova Esperança, Dez 2010